Fertilizantes Químicos 

Sergipe como Polo na Cadeia Produtiva de NPK
Produzidos industrialmente, os fertilizantes químicos têm como finalidade fornecer nutrientes fundamentais às plantas. São ricos em nitrogênio, fósforo e potássio (NPK), com o primeiro responsável pelo estímulo ao crescimento e formação das folhas; o segundo para enraizamento, floração e frutificação; e o último agrega resistência a pragas, doenças e condições climáticas adversas. Uma vez que nem todo solo é enriquecido o suficiente para garantir à plantação a quantidade suficiente de NPK, seja pela própria natureza do solo ou por seu esgotamento, o manejo adequado com a adição destes e de outros suplementos é requerido principalmente quando se deseja vastas monoculturas com objetivos comerciais.


Dada a importância, a produção de fertilizantes químicos ocupa posição estratégica na economia global. Com instabilidades geopolíticas, variações nos preços das commodities e crescente preocupação ambiental, o setor de fertilizantes tornou-se ainda mais relevante. Grandes produtores e exportadores como China (24,6%), Rússia (21,3%), Canadá (13,1%) e Marrocos (9,8%) destacam-se e, na contramão, o Brasil lidera como o maior importador com 16,5% do que é mundialmente produzido.


A guerra entre Rússia e Ucrânia, iniciada em 2022, e as restrições logísticas subsequentes evidenciaram a vulnerabilidade das cadeias globais de suprimento, levando diversos países a atuar pela autossuficiência na produção de insumos agrícolas. Nesse cenário, o Brasil, que depende fortemente de fertilizantes para sustentar sua agricultura de larga escala, importa cerca de 85% dos fertilizantes aqui utilizados, principalmente de Rússia, China, Canadá e Marrocos. Essa dependência tem impulsionado discussões sobre políticas públicas e investimentos voltados à produção nacional, como o Plano Nacional de Fertilizantes – 2050 (PNF), lançado em 2023 pelo governo federal, que busca “reduzir a vulnerabilidade externa e estimular o desenvolvimento de uma cadeia produtiva interna mais robusta e sustentável”.


De acordo com o PNF, a produção nacional de fertilizantes declinou fortemente nos últimos anos, com pior desempenho registrado em 2020, com pouco mais de 10% do que demandava. Em contraponto, há o registro de aumento de importações, com pico em 2021, o que evidencia a grande dependência do Brasil dos mercados produtores globais. Então, com base nesta incongruência, o PNF é uma “estratégia de redução de dependência do Brasil das importações” com: “estímulo à pesquisa, exploração e transformação mineral”; “investimentos na exploração, na transformação, no desenvolvimento e na distribuição de fertilizantes”; “otimização de infraestrutura e logística”; “estímulo à capacitação de recursos humanos para atuar nas áreas de pesquisa, desenvolvimento, mineração, produção e transformação”, dentre outros.


No cenário regional, Sergipe destaca-se por ter a única mina de cloreto de potássio do país em produção, bem como evidenciam-se aqui as grandes reservas de gás natural, principal matéria-prima para a produção da ureia (fertilizante nitrogenado). Ambas as características locais têm movimentado o setor nos últimos anos, com evidências na recente venda da mina de Taquari-Vassouras, localizada no município de Rosário do Catete, com promessa de novos investimentos pela empresa compradora, e com a também recente retomada da produção de ureia pela fábrica de fertilizantes nitrogenados, localizada no município de Laranjeiras. Destaque-se também a existência de 10 misturadoras atuando no estado.


Assim, compreender o atual panorama global e nacional da produção de fertilizantes químicos é essencial para avaliar os desafios tecnológicos, econômicos e ambientais enfrentados pelo setor. Com base nisto, neste texto apresentamos a dinâmica contemporânea da produção e comércio de fertilizantes, destacando o papel do Brasil nesse cenário e as estratégias em curso para fortalecer sua soberania produtiva, bem como destacamos os fundamentos químicos, as principais rotas de obtenção dos fertilizantes nitrogenados, fosfatados e potássicos, destacando as matérias-primas utilizadas e os processos químicos industriais envolvidos. No que se refere aos processos produtivos, entretanto, tomaremos apenas aqueles existentes no Estado de Sergipe.
Aspectos Técnicos

Há várias estruturas químicas possíveis que oferecem os elementos NPK aos solos. Para todas elas, é importante entender que o teor do elemento é fundamental, ou seja, a massa de N, P e K que cada fertilizante pode oferecer. Para os nitrogenados as opções mais produzidas são aquelas que apresentam o N na forma de amida, íons amônio e nitrato. A ureia (𝐶𝑂(𝑁𝐻2)2) é um exemplo amídico com nitrogênio disponível em torno de 45%, enquanto o nitrato de amônio (𝑁𝐻4𝑁𝑂3) é um exemplo amônico e nítrico com nitrogênio disponível em torno de 33%. Portanto a configuração química e a disponibilidade do elemento caracterizam a adaptabilidade do fertilizante ao uso requerido. O mesmo entendimento pode ser feito em relação aos fertilizantes potássicos e fosfatados. Para os primeiros, temos os exemplos do cloreto de potássio (𝐾𝐶𝑙), do sulfato de potássio (𝐾2𝑆𝑂4) e do nitrato de potássio (𝐾𝑁𝑂3), com respectivos teores de cerca de 51%, 43% e 39% de potássio. Novamente, da mesma maneira, temos, para os fosfatados, os exemplos do superfosfato simples SSP (𝐶𝑎(𝐻2𝑃𝑂4)2𝐶𝑎𝑆𝑂42𝐻2𝑂), do superfosfato triplo TSP (𝐶𝑎(𝐻2𝑃𝑂4)2𝐻2𝑂) e do fosfato monoamônico MAP (𝑁𝐻4(𝐻2𝑃𝑂4)), com teores de fosfato disponível (𝑃2𝑂5) respectivamente de 20%, 46% e 52%. São esses apenas alguns poucos exemplos da grande gama de fertilizantes NPK produzidos mundialmente.


A Produção de Cloreto de Potássio em Sergipe


Com operação há mais de 40 anos, a mina de Taquari-Vassouras, localizada em Rosário do Catete, Sergipe, é rica em silvinita, rocha sedimentar evaporítica contendo cloreto de potássio (silvita) e cloreto de sódio (halita) predominantemente, mas também argilominerais e gipsita em menores concentrações. É a única mina de cloreto de potássio em operação no Brasil. Além desta reserva, Sergipe também apresenta em seu subsolo, nos municípios de Capela, Japaratuba, Carmópolis, Rosário do Catete e Siriri, a carnalita, rocha também sedimentar evaporítica contendo cloreto de potássio e cloreto de magnésio, porém sem exploração comercial atualmente.


A produção do cloreto de potássio ocorre por duas frentes principais: a mineração e o processamento do minério. Pela localização em minas que chegam a cerca de 800m de profundidade, esta operação é custosa e requer equipamentos e mão de obra qualificados. Uma vez retirado o minério, ele é levado a correias transportadoras, ou elevadores, que o encaminham até a superfície. Na superfície todo o desafio está em purificar o cloreto de potássio a mais de 95%, separando-o do cloreto de sódio, principalmente.


O processo inicia-se com a britagem e cominuição do material que segue para a flotação. Este é o centro do processo de separação do cloreto de potássio. O material é embebido em água e componentes químicos coletores são adicionados com o objetivo de serem adsorvidos pelo cloreto de potássio e torná-lo hidrofóbico, facilitando sua separação na superfície (flotação). Depressores também são usados com o objetivo de manter os materiais indesejados hidrofílicos, o que impede sua flotação. A manutenção do pH em torno de 10 é outro fator de controle da eficiência do processo. Agentes espumantes também são usados com o objetivo de melhorar a formação e estabilidade da espuma na célula de flotação. Então, com ar insuflado, bolhas se aderem preferencialmente às partículas hidrofóbicas, que flutuam para formar uma espuma rica em cloreto de potássio, assim separado. Os componentes utilizados na etapa são eteraminas (surfactantes catiônicos), como coletoras; amido, carboximetilcelulose ou dextrina como depressores; álcoois leves como espumantes; ácido clorídrico e hidróxido de sódio para controle do pH.


Uma vez separado por flotação, o cloreto de potássio segue para a cristalização: consiste em promover a evaporação, aumentando a concentração da salmoura, o que induz a formação dos cristais de 𝐾𝐶𝑙, que devem ser grandes e bem formados. Em seguida é feita a centrifugação dos cristais e lavagem controlada com solução da 𝐾𝐶𝑙 puro para retirada de sais aderidos. Por fim, tem-se a secagem para reduzir a umidade de 3% a 5% para um teor final menor que 0,5% em secadores que utilizam ar em contracorrente em torno de 200ºC a 300ºC. Tem-se, então, de maneira resumida, o processo de obtenção dos grânulos de cloreto de potássio prontos para serem classificados e misturados em preparados de fertilizantes.


A Produção de Ureia em Sergipe


Também da década de 1980, a fábrica de fertilizantes nitrogenados de Sergipe, localizada em Laranjeiras, é a produtora local de ureia. Diferente dos fertilizantes potássicos e fosfatados, os nitrogenados são sintetizados, ou seja, não são minerais a serem retirados do subsolo e separados das impurezas. Aqui a principal matéria-prima é o gás natural, e o produto é gerado a partir dele.


O processo tem início com a obtenção do 𝐻2 a partir do gás natural, a reforma a vapor: reação do metano com o vapor d’água em uma superfície catalítica metálica (principalmente níquel suportado em alumina) onde 3 𝑚𝑜𝑙 de 𝐻2 são obtidos para cada 𝑚𝑜𝑙 de 𝐶𝐻4 em uma primeira etapa, chamada de reforma primária, que também produz 𝐶𝑂. Em uma segunda etapa, por reação de deslocamento, 1 𝑚𝑜𝑙 de 𝐶𝑂 produz mais 1 𝑚𝑜𝑙 de 𝐻2. Tem-se então que a reforma a vapor gera 4 𝑚𝑜𝑙 de 𝐻2 para cada 𝑚𝑜𝑙 de metano. Este 𝐻2 obtido com a reforma é um dos reagentes para produzir amônia no reator de amônia alimentado com nitrogênio atmosférico. É o processo Haber-Bosch, uma das sínteses mais antigas e importantes da indústria química que deu, em 1918, o prêmio Nobel de química a Fritz Haber pelos trabalhos desenvolvidos em escala de laboratório. Já Carl Bosch foi laureado também com o Nobel em 1931, pelo desenvolvimento do método de Haber com reações ocorrendo a altas pressões, o que viabilizou o processo em escala industrial e abriu a possibilidade de implementação da produção de fertilizantes nitrogenados, uma vez que a reforma a vapor já estava bem desenvolvida (iniciada em 1913) e com patente da BASF desde 1926.
Uma vez que já se tem a amônia, o processo segue com a reação entre 𝑁𝐻3 e o 𝐶𝑂2 obtido na reforma, este como subproduto (mas de interesse). Esta reação ocorre no reator de síntese e gera inicialmente o carbamato de amônio (𝑁𝐻2𝐶𝑂𝑂𝑁𝐻4) com a sequência da sua desidratação gerando a ureia (𝑁𝐻2𝐶𝑂𝑁𝐻2). Esta é uma reação exotérmica, com o carbamato sendo o intermediário-chave. Todo o efluente do reator passa então por destilação flash liberando os gases 𝑁𝐻3 e 𝐶𝑂2 não reagidos. Da solução, gases são removidos por absorção e stripping e recombinados para regenerar o carbamato que retorna para o reator de síntese juntamente com a amônia já separada. O processo segue com a unidade de evaporação, onde a ureia é concentrada e, a jusante, tem-se a solidificação do produto acabado (ureia granulada) por prilling ou granulação.


Como vocês, leitores e leitoras, podem observar no resumo apresentado, o processo de produção da ureia é resultado de um desenvolvimento tecnológico construído em etapas ao longo de mais de um século, reunindo contribuições sucessivas da química, da engenharia e da indústria de processos. Primeiro, tornou-se possível obter hidrogênio em larga escala graças à evolução da reforma a vapor. Em seguida, o domínio da síntese da amônia pelo processo Haber-Bosch, estabeleceu a base indispensável da indústria de fertilizantes nitrogenados. Com a amônia finalmente disponível em escala industrial, foi possível dar o passo seguinte: a síntese da ureia, baseada na reação entre 𝑁𝐻3 e o 𝐶𝑂2 proveniente da própria reforma. Essa etapa também passou por décadas de aperfeiçoamento, incorporando conhecimento sobre cinética e catálise, equilíbrio químico, reciclo de reagentes, trocas térmicas e operações unitárias como destilação flash, absorção, stripping, evaporação e solidificação. Assim, a produção de ureia consolidou-se como um processo integrado e altamente otimizado, no qual cada unidade opera de forma interdependente.

Considerações Finais


A análise integrada apresentada ao longo do texto evidencia que a química e o desenvolvimento tecnológico constituem os pilares fundamentais da produção de fertilizantes, um setor cuja importância ultrapassa o domínio industrial e alcança diretamente o desenvolvimento social, econômico e estratégico do Brasil e, de modo particular, do estado de Sergipe. A indústria de fertilizantes é, portanto, um exemplo emblemático de como o progresso científico e tecnológico transforma recursos naturais e conhecimento químico em soluções necessárias para a sociedade.


No Brasil, país cuja produção agrícola é uma das maiores do mundo, os fertilizantes são insumos estratégicos: sustentam a produtividade das lavouras, estabilizam a oferta de alimentos e garantem competitividade no mercado global. A forte dependência externa, contudo, evidencia a necessidade de políticas de incentivo, como o Plano Nacional de Fertilizantes, voltadas à redução da vulnerabilidade e à estruturação de uma cadeia interna mais bem estruturada, inovadora e ambientalmente responsável. Nesse contexto, investir em ciência, tecnologia e infraestrutura não é apenas uma opção, mas uma necessidade para assegurar soberania produtiva, segurança alimentar e estabilidade econômica.


No cenário sergipano, os impactos dessa dinâmica tornam-se ainda mais concretos. O estado abriga a única mina de cloreto de potássio em operação no país, além de relevantes reservas minerais e significativa produção de gás natural, elementos que formam a base para a produção de fertilizantes potássicos e nitrogenados. A retomada da produção de ureia em
Laranjeiras, a atividade das misturadoras locais e os novos investimentos no setor mineral reforçam o papel de Sergipe como um polo estratégico dentro da cadeia nacional de fertilizantes. Isso se traduz em empregos qualificados, desenvolvimento regional, arrecadação, atração de investimentos e fortalecimento do setor químico local, o que toda a comunidade química celebra e esta coluna octeto reverbera.


Prof. Anderson Dantas de Souza É Engenheiro Químico, Docente de Indústria Química e Petroquímica do Instituto Federal de Sergipe e Conselheiro Suplente do CRQ VIII Região/SE

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